A prisão de Lula será o tema único da eleição?
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Por José Antonio Lima (@zeantoniolima)
A prisão do ex-presidente Lula, após momentos dramáticos, tende a ser o assunto definidor das eleições de outubro. O Brasil tem 60 mil assassinatos por ano, a economia encontra-se em situação precária, com desemprego elevado e desigualdade vergonhosa, e uma crise fiscal aguarda o próximo presidente, mas hoje é impossível vislumbrar um cenário em que o debate eleitoral não se dê em torno de Lula.
O processo, a condenação e a prisão do petista dividem o país em dois campos aparentemente irreconciliáveis quando se trata do que a ação representa. Dê um lado, um grupo crê que após a prisão de Lula a “a porteira está aberta” e a partir de agora outros integrantes da classe política podem se tornar alvo da Justiça. Isso serviria para reduzir a impunidade a vigorar no Brasil para ricos e poderosos.
Um comentarista chegou a comparar a prisão de Lula à de Marcelo Odebrecht, que teria criado a possibilidade de detenção de outros grandes empresários. De fato, empreiteiros importantes caíram, mas a morosidade no andamento da Operação Zelotes, por exemplo, a envolver fraudes fiscais significativas, coloca em dúvida se essa porta está aberta a todo empresariado corrupto ou só para aqueles enredados na Lava Jato.
Essa argumentação rememora o famigerado “primeiro a gente tira a Dilma e depois o resto”, e a resposta a essa lembrança é o foro privilegiado. Michel Temer, Aécio Neves, Romero Jucá e outros só estariam a salvo por conta da proteção jurídica garantida por seus cargos públicos. Faz sentido, e tomara que seja verdade, mas isso só será verificável no futuro. Por enquanto, o único líder nacional preso é Lula.
Do outro lado, um grupo vê o processo como uma perseguição a Lula. Fecham os olhos para a proximidade do ex-presidente com os empreiteiros e descartam de antemão qualquer suspeita contra ele. É uma prática que interdita o debate acerca do mérito do processo e acaba por deslegitimar os que argumentam se tratar de uma perseguição. Afinal, se não se pode discutir se Lula é ou não corrupto, como debater?
Muitos fatos, no entanto, servem para embasar a hipótese de que estamos diante de um processo excepcional. Os mais óbvios são de 2018, ano eleitoral. Como mostrou parte da imprensa, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao marcar o julgamento de Lula para janeiro, deixou pendentes sete recursos que chegaram antes à corte. Ao condená-lo, a corte de segunda instância foi mais severa do que em 154 casos semelhantes. Além disso, a ordem de prisão expedida pela 13ª Vara Federal de Curitiba foi a mais rápida entre condenados da Lava Jato que estavam soltos. Para completar, a autorização da prisão, tornada pública na quinta-feira, foi baseada em um entendimento que contraria o divulgado pelo próprio presidente do TRF-4 horas antes.
O fato mais óbvio a embasar essa argumentação é a atuação de Sergio Moro. Não se pode esquecer que, ainda no governo Dilma, o juiz divulgou ilegalmente uma gravação ilegal feita pela Polícia Federal que, mesmo assim, foi usada por Gilmar Mendes para impedir a posse de Lula como ministro.
Não é preciso ser um defensor de Lula pessoalmente para verificar que a justiça brasileira, quando decide ir atrás de políticos, tem uma preferência pelo PT. Muitos outros atores importantes têm essa “predileção”. É o caso da imprensa e do Exército, como o general Eduardo Villas Boas deixou evidente ao ameaçar um golpe de Estado caso o Supremo Tribunal Federal tomasse uma decisão contrária àquela considerada correta por ele.
Esta divisão não vai acabar com a prisão de Lula. O debate deve se arrastar por mais algum tempo, tendo em vista que o STF ainda deve examinar a prisão em segunda instância, talvez na semana que vem. Graças à falta de habilidade de Cármen Lúcia, o tema será decidido à sombra do caso de Lula. Como Gilmar Mendes mudou de posição, há maioria para a decisão ser revertida, o que beneficiaria Lula, aumentando a convulsão política no país.
Em termos eleitorais, a prisão do ex-presidente também é decisiva. Atrás das grades, ele não poderá fazer política – não estará na campanha, nem poderá travar acordos com aliados. Seu candidato, ainda assim, deve ter uma votação significativa, como mostram os índices a medir sua capacidade de transferência de votos. Parece razoável crer que, com Lula preso, a tendência da militância é galvanizar sua posição a favor do nome indicado por ele, independentemente de quem seja. Livre, Lula teria papel ativo e, inevitavelmente, quando seu candidato aparecer bem nas pesquisas, o que é uma possibilidade muito real, o debate se daria em torno do padrinho político.
O combate à corrupção é essencial em qualquer democracia que se pretenda avançada. No Brasil, entretanto, o tema virou um jogo de empurra com único intuito eleitoral de lado a lado. Para piorar, discute-se o tema pelo prisma mais equivocado, o da punição e do Direito Penal. Medidas para ampliar a transparência e a participação popular no uso dinheiro público são basicamente ignoradas. Em vez da política pública anticorrupção, estamos fazendo uma caça aos corruptos que só fez mostrar as múltiplas deficiências do Judiciário, seja no evidente viés existente ali ou na incapacidade de fazer as leis serem cumpridas. Com esse cenário, o futuro não parece nada promissor. fffffffff
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