O saneamento básico para a saúde da criança no Brasil



A situação do saneamento básico no Brasil ainda é preocupante. Podemos citar todas as mazelas sociais e ambientais do país, mas talvez nada seja mais alarmante do que o impacto à natureza e ao cidadão causado pela ausência da infraestrutura mais elementar – os serviços de água tratada e de coleta e tratamento dos esgotos.
Traduzindo em números, o resultado de tamanho descaso é um caos para as cidades e para o país. No Brasil são mais de 34 milhões de pessoas sem o acesso à água tratada e 100 milhões não têm acesso ao esgoto. Somente 44,92% dos esgotos do país são tratados, esse cenário mostra a realidade de um país sem estrutura em saneamento básico e fadado a continuar tendo problemas na saúde pública pelos próximos anos.
O resultado de tamanho descaso é uma tragédia para as cidades e para o país, já citamos diversas vezes sobre os déficits sociais relacionados à falta dos serviços essenciais para sobrevivência de toda população, mas vale lembrar entre as áreas afetadas estão: educação, economia, turismo, imóveis e principalmente saúde.
A exposição ambiental ao esgoto e a falta de água tratada provocam doenças que abalam a saúde de crianças, jovens e adultos, a pesquisa Benefícios Econômicos e Sociais da expansão do saneamento do Instituto Trata Brasil que comprova essa tese, analisou que a situação do saneamento tem reflexos imediatos nos indicadores de saúde.

Em vídeo gravado para o Instituto Trata Brasil, Dr. Edson Liberal, embaixador do Instituto Trata Brasil e 2º vice presidente da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro, relata os prejuízos causados pela falta de saneamento. Então essas comunidades que convivem sempre com essa contaminação ambiental, com essas fezes que drenam para os seus terrenos, que as crianças convivem com ratos no entorno, sem nenhum tipo, essa população está ligada a diarreia, infecção de pele, então, fica muito mais, sem dúvida, vulnerável, qual o potencial que aquela criança chegaria em termos de altura, do peso dela, ela pode estar até com o peso normal, com a altura normal, será que se ela conseguisse viver sem essa questão de antibiótico, porque tem uma infecção intestinal, sem uma infecção de pele, será que ela não teria um desenvolvimento melhor?”
Os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que 10% das doenças registradas ao redor do mundo poderiam ser evitadas se os países investissem mais em acesso à água, medidas de higiene e saneamento básico.
Constatou-se que as crianças e jovens que moravam em áreas sem acesso aos serviços de coleta de esgoto tinham, em média, um atraso escolar 1,4% superior ao daqueles que moravam em locais com coleta de esgoto.
Os números são alarmantes, ainda mais quando falamos de mortalidade infantil. A taxa de mortalidade de crianças com até 5 anos de idade foi de 16,4 mortes por 1.000 nascidos vivos no Brasil em 2015. O reflexo desta realidade é que a diarreia mata 2.195 crianças por dia e faz mais vítimas do que a Aids, a malária e o sarampo juntos. É a segunda causa de morte entre meninos e meninas entre 1 mês e 5 anos no mundo.
Outro embaixador do Instituto Trata Brasil, Anthony Wong, professor, pediatra e diretor do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da FM-USP, relata que a falta de saneamento aumenta o risco dessa criança não crescer adequadamente. “Essa criança desvantajada vai se tornar um adulto com sérios problemas, com dificuldades para progredir e pior ainda, com dificuldade de criar os seus próprios filhos. Não é só essa geração, também afetará as gerações futuras, porque essa geração já começou com pé de desigualdade, com uma desvantagem enorme. Saneamento básico custa caro? Não, não custa caro. As consequências custam caro”. 
A economia total com a melhoria das condições de saúde da população brasileira projetada para 2035, tomando por base os afastamentos do trabalho e internações ocorridos em 2015, deve ser de R$ 756 milhões. Em vinte anos (2016 a 2035), considerando o avanço gradativo do saneamento, o valor presente da economia com saúde, seja pelos afastamentos do trabalho, seja pelas despesas com internação no SUS, deve alcançar R$ 7,239 bilhões no país.

Privações e ODS para a saúde da criança

O que mais chama atenção, além dos dados nacionais expostos, é como as crianças brasileiras estão sendo expostas à ausência destes serviços e consequentemente tendo a saúde colocada em risco. Dedico uma parte do artigo para falar sobre o último estudo publicado pelo UNICEF Brasil, “Pobreza na Infância e na Adolescência”.
Múltiplos indicadores socioeconômicos aparecem no relatório para dar ênfase aos maiores gargalos, e a privação que afeta o maior número de crianças e adolescentes é o saneamento básico – 13,3 milhões. No relatório, o conceito saneamento básico não aparece abranger água, desta forma, este indicador separado aparece como terceiro em item de privação 7,6 milhões. O descarte do esgoto é preocupante, pois 21,9% das meninas e dos meninos brasileiros vivem em domicílios com apenas fossas rudimentares, uma vala ou esgoto sem tratamento.
Ao discorrer sobre água, item ainda não previsto na Constituição Federal (a PEC 4/2018 que a insere está ainda em tramitação no Congresso Nacional), foi identificado que 14,3% das crianças e dos adolescentes não têm o direito à água garantido. Estes dados são divididos em: 7,5% têm água em casa, mas não filtrada ou procedente de fonte segura, estando em privação intermediária; e 6,8% não contam com sistema de água dentro de suas casas, estando em privação extrema. As privações de água variam de acordo com a região, sendo predominantes no Norte e no Nordeste – vale lembrar que, ainda de acordo com SNIS 2016, somente 10% de toda população da região Norte tem acesso à coleta do esgoto e 26% é o número do Nordeste.
Ter sanitário em casa não parece ser uma regra para todos as crianças e adolescentes, de acordo com o UNICEF Brasil. 3,1% das crianças e dos adolescentes não têm sanitário em casa. Crianças e adolescentes do campo sofrem mais privações do que quem vive nas cidades em todos os indicadores estudados. O percentual de meninas e meninos da zona rural que não têm seus direitos garantidos é o dobro daquele nas áreas urbanas – 87,5% contra 41,6%.
Diante de todos estes dados expostos, além de outros que existem em centenas de relatórios internacionais e nacionais, ainda estamos entre as 10 maiores economia do mundo, no entanto  debatendo assunto do século 19, expondo nossa população, sobretudo crianças e adolescentes em situações desumanas.
O Brasil gera, por ano, cerca de R$ 2 trilhões na economia, possui a maior reserva de água doce do mundo (Região Amazônica), é detentor de biomas importantíssimos para o continente e mundo (Amazônia, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica, Pampa e outros), no entanto, além de provocar danos na saúde humana ao não resolver os problemas de saneamento básico, também coloca em cheque a sustentabilidade do ambiente. Sublinha-se também o compromisso que o Governo do Brasil assumiu com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em que somos signatários principalmente dos compromissos 6 (acesso universal à água potável e saneamento), que tem impacto imediato em outros, como o ODS10 (redução das desigualdades).
Temos instrumentos de mudança importantes nas nossas mãos, seja por meio das eleições para presidente, deputados, senadores e governadores. Se não insistirmos nesse assunto, estaremos crucificando nossas próprias gerações futuras.

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